sexta-feira, 30 de abril de 2010

Do corpo e outros demônios


Para mães de primeira viagem

Diretamente do diário de bordo de minha primeira gravidez, quando esperava o grande Ismiggles, para as mães que pretendem engravidar em breve ou estão passando por isso agora. E para as que estão passando pela segunda, terceira, quarta in-utero-trip. Afinal, é sempre bom relembrar.

Nunca fui viciada em boa forma e afins – até porque trabalho com comida e bebida, ora escrevendo sobre uma e outra, ora só usando a carreira como pretexto para encher a pança e tortear os passos. Mas também nunca fui gordinha, que as molecagens da vida e o metabolismo simpático às causas duvidosas me mantiveram até hoje em peso são.

Minha curiosidade, logo que saí de casa para meu primeiro passeio conscientemente grávido, era todo o resto. Que minha barriga cresceria a ponto de pipocarem as estrias* e meus peitos despencariam em salto ornamental depois da amamentação**, eu já sabia. Que eu começaria a invejar as gazelas de bundinha miúda que passeiam aos saltos por aí, vá lá. Mas e o resto?

Me embrenhei numa dessas livrarias que mais parecem experimento científico – você entra naquela atmosfera arcondicionada e acarpetada e sente que nunca mais vai conseguir sair de lá – pra fazer pesquisas. O engraçado é que quando questionado sobre a seção dos livros de gravidez, o vendedor cheio de espinhas olha pra sua cara de pseudográvida com um meio-espanto. Parece que vai rir e apontar o dedo: “mentirosa!”. Mas tudo bem, isso não é problema nosso.

Depois de bocejar debruçada sobre 16 volumes a respeito do tema, como “moda e estilo na gestação”, “alimentos saudáveis para a mamãe” e “não importa o que faça, nunca beba e nunca fume”, caí num pequeno exemplar fantasmagórico: o que o homem precisa saber sobre a gravidez. Primeiro pensei em esconder o trunfo do meu marido, mas quando vi o conteúdo de horrores que o autor desfilava páginas adentro, corri alarmada pra perto dele. As perspectivas não eram nada convidativas.

“Senhoras e senhores, agora com vocês, vinda diretamente da Grotescolândia, a GRÁVIDA!”: Gases, hemorróidas, alargamento da vulva, falta de apetite sexual, séria restrição de posições na cama, congestão nasal, prisão de ventre, cistite, câimbra, sudorese, incontinência urinária, inflamação das gengivas, corrimento e manchas na pele.

Oh yeah, baby, gravidinha sexy. Porque dos enjôos e inchaços nos pés eu sabia (e juro que nada disso me incomodava). Mas naquele momento passei a enxergar no espelho uma figura praticamente suína – 20 quilos a mais, gengivas de lutador de boxe, a voz anasalada e uma eterna caixa de lenços de papel na mão. Pior: duas pizzas redondo-escuras embaixo dos braços, a coceira alucinante entre as pernas e os barulhos e odores constrangedores na sala de espera: “desculpa, gente, é que eu tô grávida”, avexa-se a perpetuadora da espécie.

Comecei a achar que as grávidas não pegam fila porque a sociedade prefere despachar logo os paquidermes pra casa. Questão de limpeza urbana, ponto. E a tal falta de apetite sexual só pode ser a forma que a natureza encontrou de nos compensar pelas horas extras que nossos companheiros começam a dedicar, inexplicavelmente, a partir do quinto mês de gestação, aos jogos de futebol e cochilos no fim do dia – foi mal, querida, hoje não tô a fim.

Tonta que sou, saí da livraria decidida a cortar o chocolate, que já não era tanto, e a me alistar na fatídica hidroginástica. Em algum ponto entre a seção de livros infantis barulhentos e o caixa, me venderam a idéia de ser uma Hollywood mamma, com implante de silicone nos peitos, idas diárias à academia e uma dieta à base de pepinos orgânicos.

*Cito porque funcionou: hidratante à base de óleos de amêndoas doces, macadâmia e calêndula Mater Skin, do laboratório Cosmiatric, que você acha em qualquer farmácia. Passar todo dia depois do banho, no corpanzil inteiro (dependendo da fase da gravidez, isso pode demorar uns 48 minutos. Rarara). Só sei que escapei das estrias na minha primeira gestação - e a dica mais importate é continuar a passar depois que o bebê nascer, afinal, no quesito estrias, a fase em que você desincha e perde os quilotes a mais é tão perigosa quanto a de engorda.

**Outra feliz notícia, gravidinhas do Brasil: os peitos não caíram (pelo menos não da primeira vez). A dica é exercitar os músculos que sustentam los tetones e SEMPRE usar sutiã. Usar sutiã todo dia, dormir de sutiã, acordar de sutiã, tomar banho de sutiã. As feministas que me esfreguem alho e ponham na fogueira: o sutiã é, SIM, o maior inimigo da gravidade e o melhor amigo da mulher.

quinta-feira, 29 de abril de 2010

O paquiderme que queria ser mãe. Ops, pai. Mãe. Pai. Hã?


SESSÃO VIDEOTECA DA MULHER GRÁVIDA

Júnior
Categoria: comédia besta, besta
País/ano: EUA, 1994
Duração: 109 minutos

Dei uma única risada vendo o filme. Uma. Mas isso não quer dizer que a comediazinha não funcione – eu que sou uma grávida um tanto mal-humorada, além de não ter paciência, com ou sem barriga, para a sempre péssima atuação do brutamontes Arnold Schwarzenegger (ele também, com ou sem barriga). Como em todo papel da carreira do cara, de cabo a rabo e sem exceções, ele está inexpressivo, monótono e um ótimo mau ator. Mas jaz aí parte da graça se a gente prestar atenção em Júnior só como peça cinematográfica: qual o segredo desse austríaco de sorriso mole pra ficar podre de rico fazendo uma coisa que ele simplesmente não sabe fazer?! Mistério.

Fora isso, o passatempo é simpático e tem seus momentos. O enredo não exige um raciocínio científico lá muito desenvolvido – um doutor bizarróide, personagem de Schwarzenegger, cria um remédio chamado Engravidol para ajudar as mulheres que não conseguem ter filhos naturalmente. Ainda em fase de testes nos delirantes chimpanzés – que, mais uma vez, têm uma atuação muito superior à do nosso astro musculoso –, a substância é rejeitada pelo controle de qualidade. Daí, com ajuda de outro médico, interpretado por Danny DeVito, ele resolve provar a eficácia do Engravidol testando-o em si mesmo. Pronto, circo armado.

Altamente recomendável à futura mamãe que desenvolveu um espírito vingativo e esconjura o sexo masculino sempre que o maridão esquece que ela tá grávida, pedindo pra andar depressa ou prestar mais atenção pra não quebrar tantos copos. Apaputaquepariu, né? Pois o doutor bizarróide passa por todos os perrengues da gravidez, desde os primeiros enjôos matinais e crises de choro por causa de comerciais de TV até os chutes, as dores nas costas, a busca interminável e exaustiva por uma posição confortável pra dormir e os horrores do trabalho de parto. Quer se vingar mesmo? Faz seu marido assistir ao filme com você. Talvez ele consiga entender um pouco melhor sua condição de ogra pesada, lerda e desastrada se for pra ver o ídolo exterminador do futuro fazer caras e bocas em um papel “sensível” – ou pelo menos tentar.

Tem também outro detalhe que merece atenção, desta vez por ser simplesmente ASSUSTADOR: a certa altura da trama, nosso gravidinho vai parar num lugar que eu nunca imaginei que existisse na face da Terra. Mas como estamos falando dos Estados Unidos, claro que é possível – afinal, este é o maravilhoso país dos MMs – Michael Jackson, Mickey Mouse e Mulheres Mongas. E só mesmo lá poderia haver um RETIRO para grávidas. Mas a coisa é mais grave do que se imagina. A “clínica”, igualzinha a um asilo de luxo, é alegre, florida e cheia de mulheres vestidas de cor-de-rosa. Medo. Lá as grávidas acordam, tomam café em grupo, fazem exercícios ao ar livre, trocam experiências, aprendem a colocar fraldas em bonecas, dar banho e os cambau. A idéia pode parecer bacana para algumas, mas pra mim é amedrontadora.

E cadê os maridos ou companheiros nessa brincadeira? Francamente, eu não sei. Foram viajar e deixaram suas mulheres lá pra que não ficassem sozinhas, não agüentavam mais ouvir o chororô delas ou simplesmente sumiram no mundo. A única coisa que sei, isso sim, é que eu daria um nó no pinto do meu se ele sugerisse me internar nessa casa do capeta. Porque já basta estar grávida – imagine então estar grávida e ter que suportar 40 outras mulheres histéricas na mesma situação que você, rodeada por poltronas de tafetá rosa, tendo que tomar chá e falar de gases e nomes de bebê com elas to-do-san-to-di-a? Juro que se eu acreditasse em inferno, essa seria a imagem perfeita do meu.

sábado, 24 de abril de 2010

Para mães de primeira viagem

Diretamente do diário de bordo de minha primeira gravidez, quando esperava o grande Ismiggles, para as mães que pretendem engravidar em breve ou estão passando por isso agora. E para as que estão passando pela segunda, terceira, quarta in-utero-trip. Afinal, é sempre bom relembrar.

Filhos em bastão

Beberrona e fumante compulsiva, nunca pensei que fosse engravidar tão fácil. Primeira lição: vida sexual intensa com parceiro fixo de esperma espantalhosamente denso dá nisso. Por mais que você beba litros de vinho e vodca toda santa semana – às vezes até dia-sim-dia-não, dependendo do nível de irritação com a vida – e fume maços e maços de cigarro deliberadamente, não tem jeito. Situações fecundas são situações fecundas, desde que o mundo é mundo e os fatos óbvios são óbvios.

É assim que meninas de 14 anos engravidam do primeiro namorado, mesmo que deixem pôr só a cabecinha; é assim que imbecis de 19 engravidam na balada, por mais que o infeliz goze fora; é assim que certas modelos-atrizes poliglotas conseguem pensões milionárias passando uma única noite de orgia na companhia de astros internacionais do rock; e é assim que moças como eu, que estão começando a pensar em se preparar para a primeira gravidez, mijam num pedaço de plástico e acabam com um belo sinal positivo, azul e ainda pingando, entre os dedos.

Não era pra tanto, mas juro que fiquei surpresa. Meu marido andava cantando a bola já tinha uns tempos – na verdade, ele já cantava quase antes mesmo de me levar pra cama pela primeira vez, de tanto que queria ser pai. Acontece que a gente fica esperando sentir alguma coisa especialíssima, como um Gremlin brotando das entranhas ou um bebê de Rosemary mordiscando as paredes do útero. Nada. Meus peitos incharam como numa pré-menstruação (no que já aproveitei para abusar dos decotes, que esses são os cinco dias do mês em que me sinto um tanto belucciana), ficaram doloridos e só. Nada de enjôos, nada de tonturas. Infelizmente, a barriga não endureceu.

A única coisa que mudou em mim foi pontual – e pontualmente – quando o positivo azul despontou no palito de farmácia: vou ser mãe. O primeiro pensamento foi para meu marido, que esperava do lado de fora, de tromba armada por alguma discussão patética que tivemos na véspera; o segundo foi para minha mãe, que eu gostaria que estivesse viva pra ser a primeira a saber da novidade; o terceiro foi para o maço de cigarros, que carregava os meus três últimos moicanos – sim, fumante é um serzinho doente. Vou ser mãe.

O teste de farmácia (ou momento-privadão)

Não tem coisa mais fascinante do que essa história de teste de farmácia. A coisa funciona mais ou menos assim: quando você engravida, começa a produzir grandes quantidades de um hormônio chamado hCG. Atenção para o glamour da nomenclatura – é a gonadotrofina cariônica humana. Preferia nem saber, né? Pois bem, vou me ater às informações úteis. Esse hormônio começa a ser liberado no sangue quando o óvulo fertilizado da moça se implanta na parede do útero. E um pouco do hCG também chega à urina, então voilà! É assim que um bastãozinho plástico que você tira de uma embalagem que mais parece de chiclete vai detectar se você está ou não grávida.

As instruções de uso poderiam ser tão simples que eles acabam dando uma complicada só pra dar graça. São parágrafos e mais parágrafos explicando apenas como e por quanto tempo você deve mijar no palito. Então não se assuste e retenha só o seguinte:
- A primeira mijadela do dia é sempre mais concentrada e, portanto, mais frutífera. Aliás, grande parte dos testes só detecta a gravidez nesse primeiro xixi (os que funcionam a qualquer hora do dia são mais caros). Enfim, não troque o certo pelo duvidoso e faça o teste logo na primeira sentada – afinal, nada mais digno do que descobrir que seu filho foi revelado no jato mais bem informado, culto e cheio de conteúdo que a mamãe poderia disparar!
- Deixe o bastão na posição que eles pedem – ponta esponjosa virada pra baixo;
- Se o xixi travar, pense em cachoeiras, passarinhos e passarás. Passada a tensão, deixe o amarelinho sair bravamente, como se fosse sua primeira mijada depois de nove cervejas e 10 quilômetros caminhados sem ter um único banheiro à vista;
- Tire o bastão do jato de xixi assim que se passar o tempo indicado na bula (normalmente, são só uns 5 segundos) e acabe tranqüila.
- Agora é esperar. Se aparecer uma simbólica cruz na janelinha, minha amiga, só tenho duas alternativas...

1- Parabéns! Você está grávida! Corre pra contar pro pai ansioso, antes que ele acabe de roer as unhas e comece a mastigar a ponta dos dedos!

2- Respire fundo e pense bem no que vai fazer. Só espero que o pai não seja aquele BABACA pra quem você deu bêbada dois meses atrás e que jurou de pé juntos que nunca mais encontraria nessa encarnação. E Boa sorte!

Claro, como nem tudo é perfeito, o teste de gravidez de farmácia pode dar errado. Seja porque você se atrapalhou com aqueles parágrafos e parágrafos complicados das instruções, seja porque você está grávida há tão pouco tempo que o nível de hCG na urina ainda não aparece ou seja simplesmente porque você é ruim de mira pra cacete. De qualquer forma, fique atenta à sua menstruação. Se depois de uma semana a danada teimar em não descer, faça novo teste. E procure seu médico, sempre (como esse detalhe consta em tudo quanto é texto que a gente lê na vida, não vou fugir à regra). O exame de sangue feito em laboratório (que preste, por favor) é mais elaborado e tem uma precisão de praticamente 100% já uma semana após o coito. Você não adora esse termo? “Oi, querida, o que você aprontou ontem?” “Putz, Fê, eu coitei a noite inteira!”. Então, se você tá aí ficando careca de tanta tensão, moleca, eis o seu remédio: vá e faça já o seu! Assim não restarão dúvidas e você já decide de uma vez por todas se vai continuar acompanhando esse blog ou se vai denunciá-lo como lixo internético.

Ele é humano!



Daí ontem fizemos o primeiro ultrassom. Pra descobrir que, como da primeira vez, o bebê está BEM à frente dos pais. O que achávamos que fosse uma gravidez de quase 2 meses é, na verdade, uma barriga quase IDOSA - 3 meses e 1 semana. Ops! Talvez na terceira ou na quarta gestação a gente acerte a conta (outra possibilidade é a gente descobrir a próxima gravidez quando eu for no banheiro e voltar com um nenê no colo. Ops de novo!).

Mas o que importa é que a criaturinha passa bem. Tem formas humanas, com perninhas, bracinhos e nariz, e um outro nariz entre as pernas que nos deixou bem desconfiados. O que a médica chamou de "possível formação genital masculina" a gente achou que é de fato um PINTÃO. Ou seja, ponto pra ala macha da casa - continuaremos a ter um lar "for bastards only", em que a mamãe tem que brigar pra ver filme de menina porque a galera só quer saber de Duro de Matar. E dá-lhe esfregar cueca e pedir pizza com recheio duplo. Iei!

Ambservações: na segunda foto, o pequeno (que já tem 6,37 cm) de perfil; já na primeira, vocês podem vê-lo debaixo, com a bunda virada pra nossa cara, suas duas pernocas e a "possível formação genital masculina" de quase 3 cm entre elas. Se continuar nessa proporção, o moleque tá bem na fita.

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Time after time

Vez em quando sou acusada de melodrama - coisa que herdei, assumo com orgulho, de minha avó Nair, a espanhola. Quem gosta de Almodóvar bem sabe: espanhóis são dramáticos, vivem dramas sem fim. Coisas que os brasileiros tirariam de letra - rolou, toma uma cerveja que passa -, os espanhóis cozinham em fogo brando, põem pra descansar, untam a fôrma, enrolam com cuidado em açúcar fino e botam na janela pra neguinho ver pelo resto da vida - tá lá o defunto dos fantasmas que vão te rondar for fuckin’ ever.

Cito o orgulho porque, por anos a fio, critiquei a espanhola por ser como é. Mas hoje ela tem 82 e flexibiliza mais o pensamento – e a virilha operada – do que muito marmanjo de 50. Léguas a mais do que uma frangota de 28 como eu (saquem a ironia da inversão numérica atroz), que fica fazendo malabarismos escabrosos pra salvar um tempo que já foi. Me explico à la twitter, pra quem não sabe: minha mãe, grande mulher e filha única da espanhola, morreu de câncer um tempo atrás. Drama, drama. Ficamos eu, meu pai, meu irmão e a espanhola a ver navios, cada um no seu quarto de mundo. Desde então – ou talvez bem antes disso, quando o inconsciente já tinha por certo aquilo que a paixão fazia questão de negar –, venho cometendo tropeções dignos de uma mulher à beira de um ataque de nervos.

Fuck it – vamos pingar os is. Pra quem tem mãe, um apelo: escute o que a senhôura tem a dizer. Com ou sem razão, é ela quem mais gosta de você nesse sacro mundinho de mierda. E pra quem não mais a tem, uma constatação: é verdade que a gente só tem uma mãe na vida. Podem vir mil mulheres de tetas fartas fazendo discursito sobre carinho, amor e o que quer que se aproxime de maternidade. Pum-pum, mata no canto. Mãe só tem uma. A sua. Então trata de resgatar no fundo da sua memória – e do peito adormecido – aquilo que ela te ensinou. Mãe só tem uma e é ela que vai te provar, por A + B, viva ou morta, que você tá pisando certo ou torto.

Dito isso, vamos ao blog. Melodramas à parte, venho entendendo, aos trancos e barrancos, que ser mãe é bem mais do que cuidar do beabá nada rebuscado, alimentar, brincar de esconde-esconde e dar o ombro macio pro pseudo-coma da criança que já não agüenta mais o calvário da noite. Ser mãe, minha gente, é estar atenta, dia afora e madrugada adentro – até o fim da vida –, pros perigos sacanas que rondam seu filhote (ainda) inocente. E, principalmente, pros perigos em que você mesma mergulha a criaturinha, sem saber e sem querer. Experiências de vida, espasmos grotescos, pessoas que, well, não estão nem aí.

Seu filho não merece placebos de amor. Digo isso numa noite solitária, em que acabo de entregar meu pequeno ao sono – ufa, são 23h20! -, depois de um banho tardio e um jantarzinho requentado. Olhei pra ele a noite toda, ora calçando meus tênis, ora imitando os gestos mágicos do pai, que faz moedinhas desaparecerem e reaparecerem no miolo da mão, pra deleite do molequinho. Então ele fecha a moedinha de 25 centavos na mão e grita: “pá!”. Fantástico. Daí eu penso, do fundo de minhas olheiras velhas, que nada nesse mundo pode tocar a felicidade desse menino. Nem eu. E viro bicho se alguém mexer nisso. Talvez seja o que meninas como eu (sem vergonha do auto-título aos 28 anos de idade), que trançaram as pernas por aí em baladinhas sem fim, entendam como o longínquo ideal de bem-querer. O bem-querer é assim: óbvio, sem esforço. É instinto – e se perde tão fácil quanto existe, justamente porque é bem-querer. Ou se quer, ou se não. Daí acho no livrinho de receitas da minha mãe, que é encapado com fotos de docinhos caseiros e escrito com letra de querer morrer pela janela, uma receitinha fácil e besta de, ops, bem-querer. O nome é esse mesmo e ela diz: leve ao fogo 1 lata de leite Moça, 1 colher de sopa de manteiga, 3 gemas, 250g de coco fresco ralado e 1 colher de chá de baunilha, mexendo até desprender do fundo. Despeje em prato untado e enrole depois de frio com açúcar refinado. Simples e espanhol assim - untado, enrolado e coberto de açúcar refinado. Cabe em quaisquer 10 minutinhos do dia ou da noite, pra quem não tem medo da vida e de bem-querer. Bem-quero, um dia e o quanto antes, ser assim. Boa noite, mãe. Boa noite, filho. Boa noite, pessoal.