sexta-feira, 11 de maio de 2018

Sobre meus dez dias das mães


Sempre achei fácil ser mãe. E explico o fácil: daquele tanto de avisos que gentis senhôuras dão enquanto abençoam nosso barrigão, tudo sempre me deslizou com um sossego gostoso, vida afora: amamentação, anos de sono picado, choros, dores, meningite. Fraldas, luta pra tirar fraldas, o andar e o correr, tombos, supercílios abertos em quinas de mesa, piolho. As primeiras crises e brigas, decepções, abandono, corações partidos, coordenadoras de escolinha preocupadas, acessos de raiva, gostos e desgostos de um e outro, evolução de personalidade: ei, mãe, eu sou esse aqui.
Tudo tão bom porque vinha deles – e nada que viesse deles poderia deixar de ser tão eles (no fundo tão eu, também, nesse emaranhado bonito de pernas e vidas que faz alguém nascer de você). Quis educar meus meninos para a certeza de que são livres pra ser, pensar e sentir. Lemos livros de pequenos e grandes, falamos de assuntos de pequenos e grandes, pesquisei junto, descobri junto, contei histórias de acertos e erros meus. Algo como “ei, filhos, eu sou essa aqui”.
Acho que por isso nada nunca foi pesado, mesmo nos tempos mais bagunçados. Rolava um bem-estar, de cá e de lá, por sabermos que dava pra gente ser de verdade, mesmo que não concordasse em tudo. A beleza da vida tá justamente aí, no amor e nas diferenças – e no amor pelas diferenças.
Hoje, às vésperas do meu décimo dia das mães, confesso que não acho nada mais tão fácil. E quando eu mesma for uma doce colecionadora de calendários amarelados, vou dar um único aviso, um só: zelem – mas zelem mesmo – pelo que o mundo ensina para os seus filhos. E mundo não é só internet, youtuber de boné, turminha de amigos. Mundo é família, é professor na escola, é pai e mãe. Confiar que o mundo vai respeitar a cabeça e o sentimento de uma criança é a maior ingenuidade – e o pior erro que a gente pode cometer.
Fraldas se trocam, sono se recupera, gripes se curam, acessos de raiva se explicam, corações partidos se apaixonam de novo e de novo, diferenças andam de mãos dadas. Já provar para uma criança que aquilo que ela aprendeu de uma pessoa de confiança talvez não seja verdade – e que adultos, mesmo os que a gente mais ama, são falhos e egoístas – é difícil. Crianças creem, crianças repetem o que ouvem de quem é responsável por cuidar delas. Crianças acreditam em quem diz que educa. Crianças são esponjas de quem tá mais perto, dia após dia. E nem sempre vai ser você.
Então zelem – e nunca confiem o cotidiano da educação dos seus filhos a ninguém. Os valores estão nesse dia-a-dia e as pequenas coisas, que no fundo são as maiores, também. Não é questão de ter mais ou menos tempo livre, mas sim de estar alerta e trazer pra perto quando rola aquele cheirinho de maldade no ar. A leveza da infância deve ser o primeiro e último pensamento de quem educa, numa vigília sem fim. Dependendo de como for feito e por quem for feito, o estrago pode ser grande. Então zelem – e amem, cada vez mais.