quarta-feira, 21 de abril de 2010

Time after time

Vez em quando sou acusada de melodrama - coisa que herdei, assumo com orgulho, de minha avó Nair, a espanhola. Quem gosta de Almodóvar bem sabe: espanhóis são dramáticos, vivem dramas sem fim. Coisas que os brasileiros tirariam de letra - rolou, toma uma cerveja que passa -, os espanhóis cozinham em fogo brando, põem pra descansar, untam a fôrma, enrolam com cuidado em açúcar fino e botam na janela pra neguinho ver pelo resto da vida - tá lá o defunto dos fantasmas que vão te rondar for fuckin’ ever.

Cito o orgulho porque, por anos a fio, critiquei a espanhola por ser como é. Mas hoje ela tem 82 e flexibiliza mais o pensamento – e a virilha operada – do que muito marmanjo de 50. Léguas a mais do que uma frangota de 28 como eu (saquem a ironia da inversão numérica atroz), que fica fazendo malabarismos escabrosos pra salvar um tempo que já foi. Me explico à la twitter, pra quem não sabe: minha mãe, grande mulher e filha única da espanhola, morreu de câncer um tempo atrás. Drama, drama. Ficamos eu, meu pai, meu irmão e a espanhola a ver navios, cada um no seu quarto de mundo. Desde então – ou talvez bem antes disso, quando o inconsciente já tinha por certo aquilo que a paixão fazia questão de negar –, venho cometendo tropeções dignos de uma mulher à beira de um ataque de nervos.

Fuck it – vamos pingar os is. Pra quem tem mãe, um apelo: escute o que a senhôura tem a dizer. Com ou sem razão, é ela quem mais gosta de você nesse sacro mundinho de mierda. E pra quem não mais a tem, uma constatação: é verdade que a gente só tem uma mãe na vida. Podem vir mil mulheres de tetas fartas fazendo discursito sobre carinho, amor e o que quer que se aproxime de maternidade. Pum-pum, mata no canto. Mãe só tem uma. A sua. Então trata de resgatar no fundo da sua memória – e do peito adormecido – aquilo que ela te ensinou. Mãe só tem uma e é ela que vai te provar, por A + B, viva ou morta, que você tá pisando certo ou torto.

Dito isso, vamos ao blog. Melodramas à parte, venho entendendo, aos trancos e barrancos, que ser mãe é bem mais do que cuidar do beabá nada rebuscado, alimentar, brincar de esconde-esconde e dar o ombro macio pro pseudo-coma da criança que já não agüenta mais o calvário da noite. Ser mãe, minha gente, é estar atenta, dia afora e madrugada adentro – até o fim da vida –, pros perigos sacanas que rondam seu filhote (ainda) inocente. E, principalmente, pros perigos em que você mesma mergulha a criaturinha, sem saber e sem querer. Experiências de vida, espasmos grotescos, pessoas que, well, não estão nem aí.

Seu filho não merece placebos de amor. Digo isso numa noite solitária, em que acabo de entregar meu pequeno ao sono – ufa, são 23h20! -, depois de um banho tardio e um jantarzinho requentado. Olhei pra ele a noite toda, ora calçando meus tênis, ora imitando os gestos mágicos do pai, que faz moedinhas desaparecerem e reaparecerem no miolo da mão, pra deleite do molequinho. Então ele fecha a moedinha de 25 centavos na mão e grita: “pá!”. Fantástico. Daí eu penso, do fundo de minhas olheiras velhas, que nada nesse mundo pode tocar a felicidade desse menino. Nem eu. E viro bicho se alguém mexer nisso. Talvez seja o que meninas como eu (sem vergonha do auto-título aos 28 anos de idade), que trançaram as pernas por aí em baladinhas sem fim, entendam como o longínquo ideal de bem-querer. O bem-querer é assim: óbvio, sem esforço. É instinto – e se perde tão fácil quanto existe, justamente porque é bem-querer. Ou se quer, ou se não. Daí acho no livrinho de receitas da minha mãe, que é encapado com fotos de docinhos caseiros e escrito com letra de querer morrer pela janela, uma receitinha fácil e besta de, ops, bem-querer. O nome é esse mesmo e ela diz: leve ao fogo 1 lata de leite Moça, 1 colher de sopa de manteiga, 3 gemas, 250g de coco fresco ralado e 1 colher de chá de baunilha, mexendo até desprender do fundo. Despeje em prato untado e enrole depois de frio com açúcar refinado. Simples e espanhol assim - untado, enrolado e coberto de açúcar refinado. Cabe em quaisquer 10 minutinhos do dia ou da noite, pra quem não tem medo da vida e de bem-querer. Bem-quero, um dia e o quanto antes, ser assim. Boa noite, mãe. Boa noite, filho. Boa noite, pessoal.

3 comentários:

  1. chorei. que lindo, bi. saudade imensa dos seus textos, que trazem vc na forma mais pura. amo.

    ResponderExcluir
  2. Luluca, é sempre se lendo que a gente se ama (pq "se vendo" anda foda. Rararara). Beijo, lindona. Ah, good news: amanhã volto a trabalhar na Deni por meio período! Passa lá pra me dar um abraço?

    ResponderExcluir
  3. Nunca entro nesse e-mail (hotmail) que vc não desiste de usar. Mas hoje, sabe Deus porque motivo, eu entrei e descobri que vc tem um blog. Cacete!!! Li tudinhooooooo, chorei, morri de saudade e esqueci da hora. Já passaram 30 minutos do horário da Jú ir pra cama e ela adorou isso. Acho que agora a mocinha sonha com a idéia de que o resto da família também vire blogueiro e assim eu dou uma folga na questão dos horários. Biiiii eu nem conheço o Isminha e já tem mais um baby a caminho? Delícia... Filho é mesmo tudo na vida da gente, na verdade, eles são a nossa melhor parte. Só entende quem tem. Pra vcs quatro, deixo beijos de jabuticaba e pão da lata. Além de uma vontade enorme de poder estar junto pra curtir as tuas crias, assim como, há não muito tempo, curti as da tua mama. Te amo... MUITOOOOOOOO!!!!!

    ResponderExcluir